Sentimento Crônico

Cheio de prosa! Poesia, vide verso!

Textos


Poesia em construção

Há um imóvel de família que, apesar de desocupado por um bom tempo, necessitava de alguns reparos para que pudesse ser colocado novamente no mercado para a locação ou venda. Após reunião familiar, daquelas regadas a cerveja durante um churrasco dominical, o encargo quanto aos tratos com o dito imóvel ficou sob minha responsabilidade.

Ato contínuo, procurei Seu Henrique, um mulato forte e risonho que me prestou valiosos serviços enquanto pedreiro em outras oportunidades. O homem é de formação simples, mas de competência incontestável em seu ofício, além de ser uma raridade no mercado já que é obsessivamente honesto.

No final de semana que se passou, fui visitar a obra em construção, pois mesmo sabendo que Seu Henrique lá não estaria, é habito dele deixar recados solicitando material ou dando conta do andamento do serviço – quando não, para pedir algum dinheiro por conta.

Dito e feito! O que encontrei, logo ao entrar, foi um bilhete escrito com sua letra desenhada com esforço em um pedaço de folha de caderno, devidamente dobrado ao meio e endereçado a mim. Colhi o papelucho do chão, desdobrei-o e ali encontrei a seguinte mensagem:

               “SUA CASA ESTÁ UM POBREMA

          PORTAS EMPERRADA

       E JANELAS SEM DOBRADISSA

  SEM ESPERANÇAS DE APROVEITAR REBOCO

DENTRO ESTÁ TUDO DESCASCANDO

        SEM VOCÊ DAR MAIS R$500 NÃO DÁ PRA CONTINUAR

     FALTA MUITO PRA ACABAR O SERVISSO

        DE MINHA PARTE ERA O QUE TINHA PRA DISER

            ALMANHÃ EU VOLTO”

Registrei mentalmente tudo que ali estava e dobrei novamente o papel antes de guardá-lo no bolso da calça. Chegando em casa à noite, retirei o papel para rever o recado e percebi que o havia dobrado ao contrário e, naquela metade exposta à minha vista, vislumbrei o que segue:

               “SUA CASA

          PORTAS

       E JANELAS

  SEM ESPERANÇAS

DENTRO ESTÁ TUDO

        SEM VOCÊ

     FALTA MUITO

        DE MINHA

            ALMA”

Jamais poderia imaginar que em um canteiro de obras, em plena construção, iria encontrar uma poesia.

OBED DE FARIA JUNIOR
Enviado por OBED DE FARIA JUNIOR em 21/11/2008
Alterado em 04/09/2009


Comentários

Site do Escritor criado por Recanto das Letras